Samuel Ferreira
A tarde do dia 11 de janeiro de 2016 jamais será esquecida pelos catadores que atuam na Cooperativa de Reciclagem Unidos pelo Meio Ambiente (CRUMA), localizada no bairro Calmon Viana, em Poá.
No final de mais um dia de trabalho e problemas resolvidos, eles viveram a realidade do pior pesadelo de quem trabalha com materiais recicláveis: um incêndio em grande proporção no Galpão de Triagem e Armazenamento. Por sorte, ninguém estava no local, pois já haviam fechado o expediente.
Apesar da boa intenção dos vizinhos e alguns catadores em se dirigir ao local e tentar conter as chamas iniciais, o fogo se alastrou rapidamente e nem mesmo a pronta ação dos soldados do Corpo de Bombeiros – que, segundo testemunhas, chegaram ao local em aproximadamente 15 minutos – foi capaz de impedir a destruição do fruto de um intenso trabalho, iniciado nos anos 90, em um pequeno galpão na Vila Varela.
Contudo, a ação heróica desses combatentes do fogo impediu que as chamas atingissem a guarita frontal e os compartimentos onde estão instalados os escritórios da cooperativa, nos fundos da área construída. No demais, além das estruturas do galpão, tudo o que havia em seu interior, como quatro prensas, empilhadeira, paleteira, caçamba, esteira, máquinas, equipamentos e muito material reciclável, foram completamente queimados, bem como os quatro caminhões estacionados no pátio.
Uma das vizinhas da cooperativa, a dona de casa Gislaine Alves da Silva Souza, de 53 anos, lamentou o fato ocorrido e fez um rápido relato sobre o momento em que sua família percebeu o princípio de incêndio na cooperativa.
“Eram seis e vinte da tarde quando o fogo começou a se alastrar. Meu marido saiu correndo para ver se tentava tirar os caminhões, arrombar os portões, porque não tinha as chaves. Era só explosão, explosão, aquela multidão, todo mundo querendo pular o muro para salvar a Cruma”, afirmou.
Tristeza e desolação
Um dia após o lamentável acontecimento, cuja notícia repercutiu na imprensa local e regional, bem como em redes nacional e internacional, respectivamente, os catadores aparentavam ainda não acreditar no que estavam vivendo. Ao mesmo tempo em que sentiam a dor da perda do patrimônio e do próprio local de trabalho, expressavam preocupação quanto ao futuro de suas famílias, pois a reciclagem era a única fonte de renda disponível a eles.
Prova disso é o catador Luís Antonio Neves, de 49 anos, um dos cooperados mais antigos da Cruma que, assim como os demais companheiros, externou sua angustiante preocupação com o amanhã.
“Perdi meu ganha-pão, meu sustento. Agora não tenho para onde ir, estou desempregado. Agora quero ver como eu vou fazer sem trabalhar”, disse, sentado na calçada e com patente expressão de tristeza na face.
Por sua vez, a colega de trabalho Maria Madalena não tem reação diferente de Neves: “Estou me sentindo triste, precisamos de uma ajuda do prefeito, pelo menos um local adequado para nós podermos trabalhar e sobreviver. Eu e meus companheiros dependíamos desse local de trabalho destruído”.
Além da perda do galpão e equipamentos, ela sofreu com a situação de calamidade pública provocada pelas constantes chuvas na cidade, uma vez que a enchente atingiu seus móveis e mantimentos.
“Nós não morremos, estamos vivos, então não acabou tudo”
Embora igualmente abalada, a coordenadora da cooperativa, Elza Maria Rodrigues, 58, entende que, apesar da perda material e do abalo emocional dos catadores, todos precisam se unir para recomeçar tudo e acreditar que o sonho de uma vida mais digna ainda não acabou.
“Meu astral abaixou totalmente. Na hora em que vi tudo aquilo, eu pensei ‘acabou’, mas, depois eu pensei: ‘nós não morremos, estamos vivos, então não acabou tudo’. Vamos recomeçar de novo, mais fortes e firmes no que estamos fazendo, ajudando a comunidade, nós e o meio ambiente”, disse.
“A prefeitura começou a nos ajudar, já é um bom começo e vamos tentar ver se eles ajudam mais ainda”, afirmou, se referindo à limpeza dos resíduos queimados iniciada pela prefeitura no galpão da cooperativa na quarta-feira (13). “Nós temos, diretamente, 45 famílias que trabalham aqui e indiretamente 150 pessoas que dependem dessa cooperativa”, finalizou.
Apesar da triste realidade, no dia seguinte ao incêndio, os catadores fizeram uma reflexão e concluíram que um trabalho construído há 20 anos não poderia sucumbir frente às forças negativas, por maior que fosse. Assim, se reuniram e resolveram buscar soluções para, ao menos, amenizar o sofrimento que viria pela frente.
Um grupo de aproximadamente 20 catadores, se organizou, confeccionou cartazes e se dirigiu à prefeitura. Os catadores foram recebidos pelo prefeito Marcos Borges e solicitaram a elaboração de um plano emergencial, unilateral, com tomada de ações imediatas, com a finalidade de evitar a total paralisação dos trabalhos de coleta seletiva e triagem dos catadores.
Parte dessa iniciativa teve início na manhã seguinte à reunião com o prefeito, quando, após o pedido dos representantes da Cruma, um trator da prefeitura iniciou a remoção do material queimado, que foi depositado em uma caçamba da empresa Pioneira, para a correta destinação.
Gestos de Solidariedade
Desde a notícia do incêndio, estão ocorrendo diversas manifestações de solidariedade e apoio aos catadores, tanto pessoal, quanto nas redes sociais. Até mesmo uma campanha de doação financeira ou de alimentos à Cruma está sendo proposta por simpatizantes da causa, como o ativista social, repórter fotográfico e blogueiro Adilson Santos, protagonista da ação, com a hashtag #crumacontecomigo, ação esta que começou na Comunidade POÁ COM ACENTO.
Diante disso, dirigentes da Cruma sugerem a criação de uma comissão paritária, composta por representantes da cooperativa, do poder público e da sociedade civil, a fim de acompanhar as doações, bem como a destinação das mesmas, com publicação em sites e redes sociais.
Comovidos com a causa, dirigentes da ‘El Sabor Paleteria’ publicaram em redes sociais que todo o lucro obtido com as vendas de sorvetes nos dias 13, 14 e 15 de janeiro será doado à cooperativa. A sorveteria fica situada na Avenida Vital Brasil, 381, na região central de Poá.
A Cruma é considerada de utilidade pública e mantém convênio e parceria com o Poder Público. Alterações nesse convênio, para melhor atendimento aos catadores, também foram discutidas com a prefeitura, cujas conversações serão retomadas numa reunião a ser realizada no próximo dia 29.
Enquanto os fatos se desenrolam, essas famílias de catadores buscam reunir forças para suportar a dor e superar esse difícil ciclo, sempre ‘unidos pelo meio ambiente’, como sugere o próprio nome da cooperativa.
Fotos: Samuel Ferreira
Apesar da tristeza e preocupação, catadores se unem para recomeçar tudo |
No final de mais um dia de trabalho e problemas resolvidos, eles viveram a realidade do pior pesadelo de quem trabalha com materiais recicláveis: um incêndio em grande proporção no Galpão de Triagem e Armazenamento. Por sorte, ninguém estava no local, pois já haviam fechado o expediente.
Apesar da boa intenção dos vizinhos e alguns catadores em se dirigir ao local e tentar conter as chamas iniciais, o fogo se alastrou rapidamente e nem mesmo a pronta ação dos soldados do Corpo de Bombeiros – que, segundo testemunhas, chegaram ao local em aproximadamente 15 minutos – foi capaz de impedir a destruição do fruto de um intenso trabalho, iniciado nos anos 90, em um pequeno galpão na Vila Varela.
Caminhão destinado à Coleta Seletiva atingido pelo incêndio: atividades estão paralisadas |
Contudo, a ação heróica desses combatentes do fogo impediu que as chamas atingissem a guarita frontal e os compartimentos onde estão instalados os escritórios da cooperativa, nos fundos da área construída. No demais, além das estruturas do galpão, tudo o que havia em seu interior, como quatro prensas, empilhadeira, paleteira, caçamba, esteira, máquinas, equipamentos e muito material reciclável, foram completamente queimados, bem como os quatro caminhões estacionados no pátio.
Uma das vizinhas da cooperativa, a dona de casa Gislaine Alves da Silva Souza, de 53 anos, lamentou o fato ocorrido e fez um rápido relato sobre o momento em que sua família percebeu o princípio de incêndio na cooperativa.
“Eram seis e vinte da tarde quando o fogo começou a se alastrar. Meu marido saiu correndo para ver se tentava tirar os caminhões, arrombar os portões, porque não tinha as chaves. Era só explosão, explosão, aquela multidão, todo mundo querendo pular o muro para salvar a Cruma”, afirmou.
Tristeza e desolação
Única empilhadeira a gás utilizada na logística do galpão |
Prova disso é o catador Luís Antonio Neves, de 49 anos, um dos cooperados mais antigos da Cruma que, assim como os demais companheiros, externou sua angustiante preocupação com o amanhã.
“Perdi meu ganha-pão, meu sustento. Agora não tenho para onde ir, estou desempregado. Agora quero ver como eu vou fazer sem trabalhar”, disse, sentado na calçada e com patente expressão de tristeza na face.
Galpão de Reciclagem da cooperativa ficou totalmente destruído pelo fogo |
Prensas para a produção de fardos ficaram afetadas pelas chamas |
Além da perda do galpão e equipamentos, ela sofreu com a situação de calamidade pública provocada pelas constantes chuvas na cidade, uma vez que a enchente atingiu seus móveis e mantimentos.
“Nós não morremos, estamos vivos, então não acabou tudo”
Embora igualmente abalada, a coordenadora da cooperativa, Elza Maria Rodrigues, 58, entende que, apesar da perda material e do abalo emocional dos catadores, todos precisam se unir para recomeçar tudo e acreditar que o sonho de uma vida mais digna ainda não acabou.
“Meu astral abaixou totalmente. Na hora em que vi tudo aquilo, eu pensei ‘acabou’, mas, depois eu pensei: ‘nós não morremos, estamos vivos, então não acabou tudo’. Vamos recomeçar de novo, mais fortes e firmes no que estamos fazendo, ajudando a comunidade, nós e o meio ambiente”, disse.
Trator enviado pela prefeitura remove material reciclável queimado pelo fogo |
Apesar da triste realidade, no dia seguinte ao incêndio, os catadores fizeram uma reflexão e concluíram que um trabalho construído há 20 anos não poderia sucumbir frente às forças negativas, por maior que fosse. Assim, se reuniram e resolveram buscar soluções para, ao menos, amenizar o sofrimento que viria pela frente.
Um grupo de aproximadamente 20 catadores, se organizou, confeccionou cartazes e se dirigiu à prefeitura. Os catadores foram recebidos pelo prefeito Marcos Borges e solicitaram a elaboração de um plano emergencial, unilateral, com tomada de ações imediatas, com a finalidade de evitar a total paralisação dos trabalhos de coleta seletiva e triagem dos catadores.
Parte dessa iniciativa teve início na manhã seguinte à reunião com o prefeito, quando, após o pedido dos representantes da Cruma, um trator da prefeitura iniciou a remoção do material queimado, que foi depositado em uma caçamba da empresa Pioneira, para a correta destinação.
Gestos de Solidariedade
Desde a notícia do incêndio, estão ocorrendo diversas manifestações de solidariedade e apoio aos catadores, tanto pessoal, quanto nas redes sociais. Até mesmo uma campanha de doação financeira ou de alimentos à Cruma está sendo proposta por simpatizantes da causa, como o ativista social, repórter fotográfico e blogueiro Adilson Santos, protagonista da ação, com a hashtag #crumacontecomigo, ação esta que começou na Comunidade POÁ COM ACENTO.
Diante disso, dirigentes da Cruma sugerem a criação de uma comissão paritária, composta por representantes da cooperativa, do poder público e da sociedade civil, a fim de acompanhar as doações, bem como a destinação das mesmas, com publicação em sites e redes sociais.
Comovidos com a causa, dirigentes da ‘El Sabor Paleteria’ publicaram em redes sociais que todo o lucro obtido com as vendas de sorvetes nos dias 13, 14 e 15 de janeiro será doado à cooperativa. A sorveteria fica situada na Avenida Vital Brasil, 381, na região central de Poá.
A Cruma é considerada de utilidade pública e mantém convênio e parceria com o Poder Público. Alterações nesse convênio, para melhor atendimento aos catadores, também foram discutidas com a prefeitura, cujas conversações serão retomadas numa reunião a ser realizada no próximo dia 29.
Enquanto os fatos se desenrolam, essas famílias de catadores buscam reunir forças para suportar a dor e superar esse difícil ciclo, sempre ‘unidos pelo meio ambiente’, como sugere o próprio nome da cooperativa.
Fotos: Samuel Ferreira
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